Nordestino, que por si só seria um próprio estilo literário. Seu único livro ostenta um título marcante e incomum: Eu. Sem precedentes, Augusto dos Anjos é uma metralhadora de poemas decassílabos, rimados e metrificados. Singular pela sua complexidade, seus poemas "científicos" são carregados de ironia, determinismo e filosofia. Com palavras fortes, este paraibano marca seu leitor, seja por aproximação ou por afastamento.
Um dos poemas mais famosos deste autor - e um dos meus favoritos - é Versos Íntimos. Neste poema, ou o autor estabelece um dialogo com o leitor, ou realiza uma auto reflexão. O que para mim faz mais sentido, quando se observa o título do livro (Eu) e o título do poema. Outro ponto que chama atenção é a presença de dois substantivos comuns iniciados com letra maiúscula: Ingratidão e Homem.
Todo o poema clama por mudança de postura.
Versos íntimos fala da necessidade do amadurecimento e do despertar para o mundo. Para ele, a vida não perdoa os ingênuos. Pois em sua primeira estrofe é narrada o sepultamento de alguém, que apenas a ingratidão prestigiou o enterro. Pois da mesma maneira que a ingratidão compareceu, ela também estará presente no futuro (... a lama que te espera). E quando o autor reconhece que Ingratidão é inerente ao Homem, ele comemora acendendo um cigarro. E por fim o autor dá a sua receita de como combatê-la.
É um poema que vale muito apena ser lido em voz alta!
Versos Íntimos
Vês?! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão - esta pantera -
Foi tua companheira inseparável!
Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.
Toma um fósforo Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.
Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!
Augusto dos Anjos (1901)
Fernando Diz